Durante um passeio em Wen Xian (condado de Wen) na China, comentei em um vídeo sobre a visita de uma importante professora de faculdade do Mestre Chen Bing, uma das mais reconhecidas professoras universitárias de Taijiquan na China. Com cerca de 80 anos, a Sra. Lin Supu 林素朴 tem oitavo Duan dentro das artes marciais (o máximo é nono Duan).

Em um discurso na International Chenjiagou Academy, ela enfatizou características do Taijiquan enquanto uma arte marcial, tendo sido desenvolvido pelo General Chen Wang Ting a partir da sua experiência em combate. Hoje em dia, o Taiji é voltado principalmente para nossa saúde, mas de certa forma, a marcialidade e o treinamento para saúde são vinculados. Para se sobressair dentro de uma guerra, um combate, é preciso saber preservar a vida, o nosso bem-estar, a nossa integridade. Portanto, a teoria do cultivo da energia tem tanto a ver com melhorar a saúde quanto gerar maior força física e mental. Na China, trabalhar corpo e mente é um trabalho integrado.

Nas artes marciais, como ela comentou, e é um consenso dentro das artes marciais chinesas, nós temos quatro tipos de técnicas – 四击 (Sì Jī).

(Tī) é o uso de pernas para atacar, ou seja, chutes.
(Dǎ) é o uso de mãos, seja golpes com punho ou com mão aberta.
(Shuāi) é a projeção do adversário para derrubar.
E (Ná) é uso da pressão da mão, principalmente nas articulações, para gerar torções e danificar as articulações do adversário. Então, muito dos movimentos do Taiji que têm giros, e representam torções. Então, (Ná) são técnicas de 擒拿 (QínNá) de torção e imobilização.

Essas são as quatro técnicas e existem oito métodos no Taijiquan – 八法 (Bā Fǎ).

Primeiro, (Shǒu), as mãos. As mãos são uma expressão, é uma culminância do movimento na sua extremidade. Os movimentos começam nos pés, com a nossa base, depois vem o giro da cintura, e por último ele se manifesta nas mãos. Então, precisamos de uma coordenação de todo o corpo para que o movimento das mãos seja o mais harmônico possível. Não existe um movimento isolado do braço, ele é uma culminância de todo esse processo do nosso corpo. E a mão deve então harmonizar, ser esse ponto final da mobilização da nossa energia.

(Yǎn), os olhos. Os olhos dentro da prática do Taiji devem guiar, relacionam-se com a nossa intenção. Não existe movimento sem intenção, você faz um movimento com um propósito. Então, os nossos olhos indicam qual é o propósito desse movimento. Normalmente, os olhos acompanham a mão dominante que está executando o movimento, mas não miramos de um modo muito restrito a nossa mão, como um foco exclusivo. Temos uma visão ampla de toda a área que está aqui na nossa frente, com maior predominância do foco nas mãos. Lembre-se, não é um foco único onde perde-se o resto, é uma visão do todo, mas com foco maior na sua mão para direcionar a sua intenção, direcionar sua energia.

身法 (Shēn Fǎ), estrutura corporal, o corpo. É como eu sempre falo, ele tem relação com a cintura. Todo o trabalho corporal entre o alto e baixo começa com o movimento de soltura da cintura, do giro da cintura para guiar o seu corpo. Então, o seu corpo vai ter força quando estiver bem integrado a partir da cintura, com uma boa mobilização da cintura.

Depois, quatro, 步法 (Bù Fǎ), que são as bases, os nossos pés, o trabalho de pernas. A força no Taiji é principalmente desenvolvida nas nossas pernas. Fortalecemos com bases mais baixas, treinamento de subir e descer… E lembrando sempre da direção dos joelhos em conformidade com a ponta do pé. Não se pode estar direcionando o pé em uma direção e seu joelho estar aberto ou fechado. Ele tem que estar congruente com a ponta do pé. Dessa forma, com a sua perna traseira, quando está com peso nela, com o correto alinhamento, você desloca o seu peso para frente e gera essa força, essa potência. A mesma coisa quando seu peso está à frente e você pisa corretamente, empurra o chão, seu peso vai para trás, você gera o movimento reverso.

Lembre-se sempre da direção do joelho, sempre desenvolva essa percepção, essa propriocepção do joelho, de quando ele está corretamente alinhado. Não faça os movimentos repetindo de uma forma que seu joelho esteja sobrecarregando a parte interna ou parte externa do joelho. Sempre bem direcionado e via de regra não ultrapassando a ponta do pé.

Depois, temos também o espírito, 精神 (Jīng Shén), espírito ou mente, que tem a ver com o nosso foco, com o estado de presença, que é muito importante no Taiji.

Além disso, tem o (Qì) enquanto energia vital, mas também como respiração. A nossa força interna tem muito a ver com a respiração, porque a respiração trabalha o yin e yang, inspira e expira, abertura e fechamento. Os movimentos arredondados do Taiji têm muita relação com isso, você girar a sua força a partir da coordenação do seu corpo, trabalhando essa abertura e fechamento junto da sua respiração. Por exemplo, quando você vai aplicar um golpe, você não vai exteriorizar um movimento potente enquanto puxa o ar. É o contrário: você acumula, cresce internamente e aí solta o ar e aplica o golpe. É o natural em todas as artes marciais. O Taiji parte sempre da naturalidade. Então basta observar o que é natural para você e aplicar isso no contexto da sua arte.

O (Lì) é a nossa força, a força física. Desenvolver a força. Embora o Taiji não enfatize no aquecimento o trabalho específico de fortalecimento (flexões de braço, abdominais), ainda assim é importante que o seu corpo esteja fortalecido. Trabalhamos de outras formas, como através do treinamento de Qigong, que vai vitalizando o corpo a partir do interior. Então, o corpo vitalizado é muito importante para você poder praticar o Taiji da forma correta. Se a sua musculatura estiver frágil, você não poderá executar os movimentos corretamente, não conseguirá ter harmonia no movimento porque seu corpo está fraco. Então, é importante desenvolver a força.

E por último, o (Gōng), que é o mesmo “gong” de Gong Fu (Kung Fu), que é a habilidade ou a maestria que se consegue através da prática contínua. O Taijiquan tem a ver com o seu empenho em praticar sempre, com regularidade, e se desenvolver na prática. Não é só fazer por fazer como uma ginastiquinha, mas você tem que saber que é um caminho de desenvolvimento, é Kung Fu. Kung Fu é justamente a habilidade conquistada com o seu empenho e com o treinamento regular. Lembre-se que existe um caminho de desenvolvimento no Taiji e é importante avaliar o seu progresso nesse caminho.

Marco Moura
12 de outubro de 2024 – Wenxian, China

Uma resposta

  1. Este trabalho de corpo e mente de forma integrada é muito bem explicado, estimulado, conduzido e proporcionado nas suas aulas, bem como está presente na descrição detalhada que escreveu aqui. Obrigada por compartilhar, de diversas formas, suas experiências, aprendizagens e sabedorias!

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